No Fim do Inverno - Capítulo 15
A Ordem de Wilhelm II
O corredor parecia estranhamente longo.
Eunice lançou uma olhadela discreta para os cabelos azul-marinho do homem, que ondulavam em sincronia com seus passos, então voltou os olhos para frente.
Caminhar sozinha com Glenton a deixou sem saber o que dizer.
O escritório estivera tão barulhento, e agora o silêncio entre eles era quase constrangedor.
Falar sobre o ocorrido com Louise e Johannes parecia inapropriado para uma conversa com o chanceler do reino.
E Glenton também não demonstrava interesse em trazer à tona aquele assunto embaraçoso.
‘Sou a única se sentindo desconfortável?’
Ela desejava que chegassem logo à sala onde o corvo estava.
Era ainda mais difícil porque ela não conseguia ler o que se passava na mente de Glenton.
Mesmo quando, frustrada, olhava para ele de relance, seu rosto não revelava nenhuma emoção.
O homem se assemelhava a uma escultura. Ou, de forma menos gentil, a algo não humano.
— Você sente falta de Tranche?
A pergunta inesperada surgiu de repente. Ao virar o rosto, Eunice encontrou o olhar calmo de Glenton fixo nela.
Os olhos acinzentados por trás dos óculos pareciam agulhas afiadas. Como se pudessem atravessá-la, Eunice desviou o olhar rapidamente.
— Eu só queria avisar que cheguei bem, só isso.
— Entendo.
Ele ajustou os óculos por hábito e respondeu com indiferença:
— O Sul é bem diferente daqui. Assim como este lugar pode parecer estranho a você, imagino que você também seja vista como algo exótico e fascinante.
A voz impassível cortou seu coração com uma profundidade surpreendente.
Foi um lembrete de que ela não pertencia àquele lugar. De que não fazia parte de Nordisch.
De que era uma estrangeira.
“Ela é como um corpo estranho.”
“Não combina nenhum pouco com o nome Pavlone.”
“Seja grata por permitirmos que alguém tão desagradável como você viva entre nós.”
As vozes de Sophia, Philip e sua madrasta Deborah zumbiam em seus ouvidos.
E não era apenas a família dela.
O rei Wilhelm II, a princesa herdeira Lichena e toda a corte encaravam a existência de Eunice com desagrado.
‘Não importa para onde eu vá, nunca sou bem-vinda.’
Nem mesmo vindo para Nordisch, algo havia mudado.
Essa percepção gelou seu coração.
Se sentiu patética por ainda se magoar com algumas palavras, mesmo sendo adulta.
Racionalmente, era óbvio que ninguém ficaria feliz em receber uma rainha estrangeira.
Preciso reforçar meu escudo, para não me ferir, não vacilar. Tenho que proteger meu coração.
— Pode haver pessoas que se comportem de maneira rude.
— Sim.
— Nesse caso, me avise.
— … Perdão?
Eunice achou que tinha ouvido errado.
Quando o encarou, surpresa, Glenton sorriu, seus olhos formando covinhas.
Era um sorriso discreto e adequado, mas, por algum motivo, parecia perturbador.
Como se estivesse dizendo que ele mesmo daria um jeito em quem a ofendesse, se ela contasse.
— …
Os olhos verdes de Eunice tremeram.
Ela não conseguia decifrar o que o chanceler queria dizer com aquela oferta.
Estava acostumada demais a desconfiar para simplesmente confiar nele, e sua hesitação transpareceu.
Glenton continuou:
— Maltratar a rainha é um insulto à família real. Pode não parecer, mas sou bastante leal.
— Entendo…
Mesmo assim, ela não conseguiu responder: ‘Com certeza irei relatar.’
Escolheu suas palavras com cuidado:
— Só de ouvir isso já me sinto aliviada. Obrigada.
Mas seu coração já havia se derretido com aquelas poucas palavras.
Eunice riu de si mesma, por ser tão fácil de ferir… e tão fácil de consolar.
Não queria ser como um junco, balançando ao vento.
Mas não sabia como se manter firme.
Até a armadura mais bem forjada tem suas frestas.
Não importa o quão firmemente se segure um escudo, golpes inesperados sempre encontram um caminho.
E este veio de uma forma que ela não conhecia.
Antes que percebesse, havia aberto a parte mais vulnerável do seu coração, completamente desprotegida.
Era pura gentileza? Ou uma estratégia calculada, envolta em sutileza?
De uma coisa tinha certeza: aquela voz gentil e o sorriso sereno haviam atravessado mais profundamente do que qualquer ataque direto, abalando-a por completo.
Como se quisesse uma promessa dela, Glenton sorriu ainda mais amplamente e parou.
Eles haviam chegado.
— Aqui estamos.
Com um gesto refinado, abriu a porta.
Além da porta que se abriu lentamente, havia uma sala de estilo antigo.
O bater das asas e os murmúrios de corvos-mensageiros ecoavam no ambiente.
— O duque de Pavlone deve estar preocupado com sua preciosa filha. Por favor, tome o tempo que precisar para escrever.
Eunice agradeceu com um aceno e adentrou o local.
O som da porta se fechando e os passos de Glenton se afastando ressoaram atrás dela.
Sozinha, observou o ambiente.
Pergaminhos enrolados, pequenas folhas de papel, estojo de cartas, cordas para amarrá-las aos pássaros e o corvo bicando sua ração na gaiola.
Assimilando cada detalhe, Eunice se aproximou lentamente da escrivaninha.
No instante em que se sentou, um suspiro profundo escapou.
O que deveria escrever?
“Avise-me assim que estiver grávida.”
A voz de Rockford grudou em sua mente como piche.
“Ainda me custa acreditar que você é filha minha e de Solenne.”
Aquelas palavras, que outrora dilacerou seu coração, agora soavam como um eco distante.
Com um rosto sombrio, Eunice pegou uma folha em branco.
Pequena e quadrada, parecia uma onda gigante prestes a engoli-la.
— Haa…
Um suspiro esfumado escapou entre seus lábios.
Ela mergulhou a pena na tinta e, após encarar a folha em silêncio por um tempo…
Finalmente decidida começou a escrever a primeira frase.
No mesmo instante, o peso esmagador em seus ombros se desfez como fumaça.
Nada de sentimentos pessoais. Apenas o essencial. Como sempre.
Uma vez iniciado o fluxo, tudo parecia familiar.
Assim como quando fazia relatórios para Rockford sobre o ducado.
Escreve, escreve.
O som da pena deslizando pelo papel preenchia o ar. O ruído suave, suficiente para encobrir sua respiração, acalmava ainda mais o coração.
Suas emoções, antes turbulentas, começaram a se assentar. Se conseguisse evitar novos abalos, as impurezas afundariam, e a clareza retornaria.
Ela escreveu:
Chegou em segurança a Berzan.
Os preparativos para o casamento iam bem.
Nordisch não é tão árido quanto os rumores sugerem.
A recuperação da Terra da Morte estava sendo acompanhada por lá também.
Escreveria novamente se surgissem novidades.
Não havia informações significativas, mas a carta ainda parecia convincente.
Eunice pousou a pena e encarou o nada.
Seus olhos verdes pareciam vazios.
Ao fechá-los, o verde de Saint-Laurent ainda cintilava em sua memória.
Ela havia deixado um pedaço grande demais de seu coração em um lugar onde ninguém a esperava.
“Você sente falta de Tranche?”
Sentia, sim.
Mesmo cheio de dor, ela havia cultivado flores belíssimas lá.
Cuidou delas com carinho, para que não murchassem.
Seus sentimentos, florescendo em Tranche, eram sinceros.
“Se a Senhora Solenne estivesse viva, tenho certeza de que ela desejaria que você aproveitasse todas as coisas belas do mundo: o calor do sol, a brisa suave, os pêssegos doces… Há tanta beleza por aí.”
Ela sentia falta de Mari.
Parecia ouvir, por meio dela, palavras que sua falecida mãe teria dito.
Eunice ouviu Mari, cuidou da terra amada por sua mãe, e a cultivou com todo o coração.
Nesse processo, apaixonou-se por Saint-Laurent, pelo Ducado Pavlone, por Tranche.
Uma risada amarga pairou no ar.
Foi quando ouviu uma batida à porta.
Arrancada dos pensamentos, Eunice virou rapidamente.
A porta se abriu — Johannes entrou.
— Terminou sua carta?
— Vossa Majestade.
Eunice se levantou de maneira desajeitada e tentou, discretamente, virar o papel. Mas se arrependeu no mesmo instante, os olhos azuis-gélidos afiados de Johannes perceberam o movimento.
— Só pensei que talvez você tivesse escrito alguma bobagem da Louise.
Explicando o motivo da visita, Johannes se aproximou rapidamente e inclinou-se.
Pega de surpresa, Eunice despencou de volta à cadeira.
— I-Isso… não se preocupe com isso.
As bochechas dela coraram.
Determinada a não cometer o mesmo erro, concentrou-se para manter os olhos longe da carta.
TAP.
Um gesto sutil se seguiu.
Johannes tocou o dorso de sua mão com o dedo.
Ele queria que ela tirasse a mão da carta.
Aquele pedido, arrogante e relaxado, fez Eunice prender a respiração.
Estaria ali para inspecionar sua carta?
Obediente, ela retirou a mão.
Ao mesmo tempo, decidiu ser ainda mais cautelosa dali em diante.
Seus olhos, carregados de tensão, observavam ansiosos a leitura de Johannes.
Não havia muito o que dizer, nada problemático, mas mesmo assim…
— Hã?
— …?
Um riso seco escapou entre os dentes do homem.
Os olhos verdes de Eunice estremeceram.
— Então era isso mesmo. Como imaginei.
Sua voz soou gélida ao continuar:
— Seguindo a ordem de Wilhelm II, você já está ansiosa para gerar meu herdeiro?
Continua…
Tradução: Elisa Erzet