No Fim do Inverno - Capítulo 18
O Lado do Rei
Será que realmente tinha tocado em um ponto sensível?
Eunice soltou um suspiro profundo enquanto caminhava pelo jardim coberto de neve. Já havia perdido a conta de quantos dias se passaram. Quantos dias desde que ela não tinha sequer vislumbrado um fio de cabelo de Johannes.
Era mesmo algo para ficar com tanta raiva?
Tudo por causa do que ela dissera — que tentaria engravidar de um filho dele de acordo com as ordens de Wilhelm II.
Talvez fosse simplesmente o fato de o rei de outro país estar interferindo na questão de produzir seu herdeiro que o tivesse aborrecido…
— É um casamento político.
A pressão sufocante em seu peito a fez murmurar isso em voz alta, sem perceber. Ao ver sua respiração se dissipar no ar gelado, seu humor afundou ainda mais.
Talvez ele só estivesse ocupado.
Se fosse ao escritório novamente como da última vez, tudo se resolvesse. Ele poderia voltar a sorrir de forma radiante por algo trivial.
Mas não conseguia reunir coragem.
Desta vez, não havia nem mesmo uma desculpa frágil como devolver as luvas dele.
Preso nesse limbo, incapaz de fazer qualquer coisa, seus pensamentos não paravam de voltar ao mesmo lugar.
Como era possível que eles não se esbarraram por coincidência? Haviam se encontrado logo no dia seguinte após chegarem a Berzan. E se ele realmente quisesse, ele poderia vir aos seus aposentos a qualquer hora, não poderia?
E ainda assim, ele permanecer completamente fora de vista desse jeito… talvez estivesse usando o trabalho como desculpa para evitá-la.
Se invadisse o escritório dele agora, sem qualquer aviso… poderia acabar sendo a pior jogada.
Lembrar do último momento em que viu Johannes sair do quarto só reforçou essa certeza. Ele parecia zangado. Talvez até levemente enojado.
‘E se ele cancelar o casamento?’
Imaginar o pior cenário fez um calafrio percorrer seu coração.
Ser mandada de volta para Tranche — não poderia haver inferno maior do que esse.
Já conseguia ouvir o eco de todo o escárnio e desprezo dos círculos sociais de Tranche.
Ser descartada depois de ir até Nordisch? A essa altura, teria sorte se o príncipe herdeiro Kallion ainda a quisesse como amante. Quem aceitaria uma mulher com uma mancha dessas?
Tanta vergonha trazida ao nome Pavlone.
Ser devolvida depois de nem sequer chegar ao casamento, isso sim é uma mulher inútil.
Era como se espectadores sem rosto estivessem lançando adagas diretamente em seu coração.
Com a respiração falhando, Eunice procurou por Hannah com olhos desesperados.
A criada, a quem ela insistira em dispensar para caminhar sozinha, estava postada com diligência na entrada do jardim.
— Haa…
Se sentiu um pouco mais composta.
Hannah, que a ajudava passo a passo com os preparativos do casamento, parecia um sinal de que a aliança matrimonial ainda estava em andamento.
Até mesmo naquela manhã, elas haviam falado sobre o casamento.
Só mais um dia.
Então ela veria o rosto de Johannes na cerimônia.
O desconfortável distanciamento entre eles… certamente uma noite seria suficiente para repará-lo.
— Eu nunca a vi antes.
— …?
Justo quando tentava acalmar sua mente ansiosa, uma voz aguda cortou o ar.
Ao virar a cabeça, viu uma mulher parada no meio do jardim branco, com longos cabelos negros caindo até a cintura.
— Então é você?
A mulher estava com os braços cruzados, o queixo erguido de forma arrogante, como um gato com o pelo eriçado.
Uma pequena pinta ao lado do olho tornava seus traços já afiados ainda mais agressivos.
Eunice examinou calmamente a estranha grosseira da cabeça aos pés.
A outra mulher, percebendo o olhar, tornou o tom ainda mais cortante.
— Ouvi dizer que a mulher de Tranche, sem saber o seu lugar, veio roubar o lugar de rainha. Parece que é verdade.
— …
Eunice prendeu a respiração em silêncio.
As palavras de Glenton ecoaram em sua mente.
‘O Sul é muito diferente. Assim como este lugar vai parecer estranho, você também parecerá estranha e deslocada para os outros. Alguns podem até ser rudes.’
E ele também disse: ‘Se isso acontecer, venha me contar.’
É claro, Eunice não tinha intenção de contar a Glenton cada coisinha.
Ela não fazia ideia de quem estava aliado a quem nos bastidores e não queria agir de forma descuidada sem entender o terreno.
Além disso, a ideia de dedurar alguém parecia infantil. Ela não era uma criança.
— Eu sou Eunice von Pavlone. Vim de Tranche em nome da aliança entre nossos dois países.
Ela falou com calma, então fitou a outra mulher, esperando silenciosamente que ela se apresentasse em retorno.
O rosto da outra distorceu de irritação diante da sugestão não dita.
— Hah.
— …!
— O que é esse olhar? Você ousa me encarar desse jeito?
— …Você é alguém acima da rainha?
Não que ela acreditasse que tal posição existisse. Mas se existisse, isso seria ruim.
Eunice observou a mulher com cautela.
Mas com sua pergunta inocente, a outra explodiu como se tivesse sido golpeada.
— Está zombando de mim? Eu quase fui rainha! Se você não tivesse aparecido, aquele lugar teria sido meu!
Quando alguém diz algo absurdo demais, o cérebro simplesmente trava.
Eunice se viu olhando fixamente, tentando processar o que aquela mulher estava dizendo. Sua mente rangia lentamente, tentando acompanhar.
— Disseram que Johan escolheu você, então eu fiquei me perguntando o que tinha de tão especial. No fim, não é nada. Nem bonita assim.
— …Então você era a segunda opção para rainha?
— …!
Os olhos da mulher flamejavam de fúria com o golpe em seu orgulho.
Ela apontou o dedo diretamente para o rosto de Eunice.
— Eu nunca aceitarei alguém como você como rainha. Vou ficar de olho bem aberto.
Um aviso claro: se Eunice não desempenhasse seu papel perfeitamente, ela a derrubaria.
Eunice não sabia se aquela mulher realmente tinha poder para fazer isso, mas uma coisa era clara. Mesmo para alguém que nada sabia sobre Nordisch, era óbvio.
— Minha senhora, o lado do rei é um lugar pesado para se estar.
— O quê?
Ela afastou o dedo rude.
— Não é um assento que se conquista fazendo birra.
— Co-como assim…
A mulher, que até instantes atrás estava tão agressiva, começou a gaguejar.
Aproveitando a mudança, Eunice apontou friamente:
— Primeiro, corrija esse hábito vulgar de apontar o dedo para as pessoas.
— Vo-você…
Agora ela só abria e fechava a boca como um peixe. O rosto ficou vermelho, como se fosse explodir a qualquer momento. Até seus olhos violeta se encheram de lágrimas de humilhação.
Whooooosh…
Uma rajada de vento atravessou o jardim silencioso. Alguns segundos depois,
— AAAAAH!
A mulher, que estava congelada como uma estátua, explodiu de repente.
— Quem você pensa que é para me dar lição?!
‘Ela é louca?’
‘Fui longe demais?’
Eunice instintivamente deu alguns passos para trás.
A mulher avançou com a mesma rapidez.
— Você não sabe nada sobre mim e o Johan, sabe?! O que você sabe sobre o lado do rei?!
— Po-por favor, se acalme. Este casamento não é baseado em amor, é–
— Você, vindo de sabe-se-lá-onde, ousa me dar lição?!
— O Reino de Tranche é um país com uma longa e nobre história. Eu sou a filha da Casa Pavlone.
— Como se eu me importasse! Pare de me irritar!
Que ameaça. Ela lembrava o príncipe Kallion.
Como uma criança mimada que nunca aprendeu boas maneiras, agora crescida.
Por que Nordisch também tinha alguém assim?
Sua cabeça começou a doer.
Perdendo todo o controle, a mulher correu para um canteiro de flores e começou a chutar e pisar nas pequenas plantas.
Eunice, que havia admirado silenciosamente as flores da neve desabrochando nos galhos, ficou horrorizada.
— Ah! O que está fazendo?!
— Me solta!
Ela não podia.
Se deixada sozinha, aquela mulher selvagem poderia destruir o jardim inteiro.
Eunice a agarrou com toda a força, envolvendo-a com os braços. Era uma cena ridícula, toda a etiqueta esquecida, mas não havia escolha.
— Pare com isso! Você está destruindo as flores de neve!
— É isso que eu quero! Eu vim para acabar com este jardim!
— Affff!
Como uma mulher podia ser tão forte?
Eunice, que passou a vida atrás de uma mesa, não teve a menor chance.
A mulher balançou os braços descontroladamente, e Eunice foi arremessada como papel.
Ou teria sido.
— …?
Se preparou para cair de bunda no chão,
Mas no meio do caminho, seu corpo parou no ar.
Alguém estava segurando sua cintura.
Eunice levantou a cabeça lentamente.
— Ah…
Ela não o via há dias, e de todos os momentos, tinha que ser este.
— Seu idiota, Johannes Reinhardt! Você não entende nada do coração de uma mulher, seu imbecil!
Oh, não. Ela é mesmo insana.
Eunice até esqueceu de respirar enquanto observava com atenção.
O rosto de Johannes era aterrorizante.
Ele a ajudou a se levantar e começou a avançar para frente.
Parecia o deus da morte.
— Avril.
— Eu disse que queria este jardim! Você falou para eu aproveitar como quisesse! E agora me apunhala pelas costas assim? Seu desgraçado!
— Quem você está chamando de desgraçado.
— Obviamente é você, Joha–AAAARGH!
— …
Um grito alto ecoou pelo ar.
Ao longe, um bando de pássaros levantou voo.
Continua…
Tradução: Elisa Erzet