Meu Amado Opressor - Capítulo 14
Depois de olhar para o cartão de visita por um tempo, Heiner surpreendentemente não teve nenhuma reação em particular. Ele apenas colocou o cartão de visita no bolso da calça, não na bolsa de Annette.
Um silêncio desconfortável caiu.
Annette, que estava brincando com sua xícara de chá, abriu a boca hesitantemente. – “É de Ans.”
As mãos de Heiner pararam por um momento enquanto colocava os pertences de volta na bolsa dela. Ele olhou silenciosamente para cima, fechando a bolsa com um movimento natural.
“Se eu o seguir…” – Fechando os olhos, Annette continuou a falar. – “Será que isso pode ser a melhor coisa para mim? Não estou dizendo que vou segui-lo. Só estou pensando.”
“Não sei que tipo de respostas quer de mim.”
“Existe uma facção de Restauração da Monarquia em Franche?”
Os olhos de Heiner se estreitaram ligeiramente diante da pergunta direta.
“Heiner, você sabe se há?”
“Ansgar Stetter disse isso? Que há forças para a restauração da monarquia em Franche e que você deveria se juntar a elas?”
“Não, cheguei a essa conclusão sozinha. Tudo o que Ansgar queria era que eu fosse com ele.”
“Por que me pergunta se já tem essa ideia em mente?”
“Estou lhe informando que não estou escondendo nada de você e que não vou fugir com Ansgar secretamente.” – Sua voz não estava desesperada, embora ela insistisse em sua inocência.
Não havia nenhuma emoção especial no rosto de Heiner enquanto ele ouvia. – “…Bem, mas poderia acontecer.” – Ele cuspiu sem gosto enquanto pensava em alguma coisa. –
“…Porque no passado Ansgar Stetter gostava de você e agora ele está solteiro.
“Além disso, se houver uma força de restauração da monarquia em Franche, como você pensa, irão lhe tratar muito bem. No entanto, não posso lhe garantir isso já que sua reputação é tão ruim em Padania que você pode não ter utilidade para eles.” – Heiner parou de falar por um momento e sorriu sem entusiasmo. – “Você disse que não há nenhum lugar onde você possa ser feliz, e ainda assim, encontrou um lugar que te aceitaria. É uma suposição inútil de qualquer forma.”
“Como eu disse, não fugirei com Ansgar. Posso estar errada em meu palpite, mas…” – Annette continuou falando em tom cauteloso. – “Caso ainda não soubesse… então eu só queria que estivesse ciente sobre a possível existência dessas forças em Franche. Claro, você já deve saber…”
“Você não ganhará nada me dizendo isso.” – Os olhos cinzentos, como os de um informante, deslizaram lentamente pelo corpo dela, depois voltaram para cima. As pontas do cabelo dela, contra a luz, pareciam quase brancas.
Annette riu amargamente. – “Achei que você estivesse tentando tornar o mundo um lugar melhor.”
O mundo de hoje era um mundo melhor do que era antes? Annette não achava isso, porque o mundo atual era muito duro para ela.
Mas as pessoas diziam: ‘O mundo está melhor agora e será ainda mais no futuro’. Então eles devem estar certos, porque era uma mulher tola e insensata. Ela nunca fez seus próprios julgamentos e, mesmo que fizesse agora, estariam errados.
Suas palavras para Annelie Engels também foram sinceras. Annette respeitava a causa das pessoas que tentavam mudar o mundo, mesmo que essa causa fosse infinitamente cruel com ela. Mesmo que ela não se identificasse. Sentimentos como vingança e ressentimento já tinham desaparecido há muito tempo, como cinzas queimadas, era apenas uma velha cicatriz.
No silêncio, ela podia ouvir a respiração de Heiner. Era uma respiração tão forte e regular quanto seu temperamento. –
“…Eu nunca pedi simpatia a você.”
Em silêncio por um momento, Heiner colocou a mão no cobertor. Então ele abaixou a parte superior do corpo para perto dela, os ombros de Annette ficando tensos quando seu rosto severo se aproximou. Uma voz rouca pairava no ar.
“Não pense, Annette. Apenas siga o fluxo.”
“…”
“Você é boa nisso, não é?” – Ela certamente estava sendo ridicularizada, mas por algum motivo Heiner é quem parecia magoado.
Ele rapidamente apagou sua expressão dolorosa e abriu a boca novamente com um rosto frio. – “Sei muito bem o que Ansgar Stetter quer de você. Se você não tivesse se casado comigo, seu marido teria sido ele. Não acredito em uma palavra que você diz.”
“Eu nunca o amei.”
“E quando os casamentos entre nobres foram realizados somente por amor?”
As palavras de Heiner não estavam erradas. Eles eram um caso único, pois se amavam e se casaram depois de namorar. Mesmo que, na realidade, ele tenha mentido.
O chá esfriou em pouco tempo. Annette murmurou em voz baixa. – “Estou falando sério, quer acredite em mim ou não.”
Se seguir Ansgar era a próxima melhor opção, ela já sabia qual era sua melhor opção. Dois olhares tristes se entrelaçaram. Annette tomou outro gole de chá e então colocou sua xícara de chá na mesa lateral.
“Estou cansada. Quero dormir.”
Heiner olhou para o rosto dela como se tentasse ver se suas palavras eram verdadeiras. Annette virou a cabeça e ele levantou a parte superior do corpo se afastando. Quando Annette se virou, Heiner apagou o lampião a gás e a escuridão rapidamente tomou conta do quarto. Houve um farfalhar atrás dela quando ele se deitou. Annette fechou os olhos e tentou dormir.
Dois corpos intocados esfriavam lentamente como a água do chá.
***
Heiner levantou-se da cama antes do amanhecer. A luz que se filtrava pelas cortinas, que não fechavam completamente, banhava a cama de um tom pálido. Silenciosamente removeu as cobertas e olhou para a mulher deitada bem longe dele.
Annette, que parecia incapaz de dormir até tarde, dormia pacificamente. O cobertor branco subia e descia em movimentos pequenos e regulares. Heiner inconscientemente se inclinou para perto dela, vendo sua bochecha macia exposta entre o cabelo e o cobertor. Ele sem querer estendeu a não para tocá-la e parou, então esfregou o rosto amargamente com a mão que havia retirado.
‘Isso é inconveniente, eu deveria ter reservado um quarto separado…’
Fazia muito tempo que ele não dividia a cama com Annette. Ele pretendia originalmente ficar em outro quarto, mas se sentiu estranhamente desconfortável com a ideia. Exatamente o que estava lhe perturbando, ele não sabia. Tentando tirar da mente a imagem de Annette entrando no mar, ele silenciosamente se levantou da cama e andou em direção ao armário.
O olhar de Heiner de repente se fixou em um ponto enquanto ele tirava um charuto do bolso do casaco. O bolso do cardigan de Annette ao lado do dele estava estufado. Ele tirou coisas do bolso e olhou para elas, notando algo que brilhava na escuridão.
Ele pensou que fossem joias, mas, após uma inspeção mais detalhada, percebeu que eram objtetos inúteis. – ‘O que são todos esses pedaços de lixo?’
Ele se perguntou o que ela estava tão ansiosa para pegar, mas era só isso, lixo. Por algum motivo, isso o deixou desconfortável. Heiner jogou-os no lixo e saiu para a sacada, sentido sua respiração ficar mais fácil ao ar livre.
Ele não conseguia ficar em espaços escuros e fechados por muito tempo. Seus ataques de pânico estavam melhores agora e não completamente impossíveis de suportar, mas a sensação de estar mentalmente na defensiva ainda permanecia. Isso se devia às suas memórias na câmara de tortura. Seu psiquiatra era o único que sabia desse fato, pois todos os outros que poderiam saber já estavam mortos há muito tempo.
Seu cabelo esvoaçava na brisa fresca da noite, podia ouvir as ondas quebrando à distância. Heiner olhava para o mar escuro com um charuto apagado na mão. Ele não era fumante, já fazia muito tempo que tinha parado de fumar, mas quando sua mente estava em um estado complicado, um charuto em sua boca parecia que poderia entorpecer seu pensamento, mesmo que só um pouco. Ajudava, mesmo que ele nunca o tivesse acendido.
‘Acho que é psicológico.’
Heiner viu muitos aspectos psicológicos desse tipo: pessoas reclamando de dor em uma perna que havia sido amputada há muito tempo (dor fantasma) ou pessoas que foram enganadas a tomar remédios falsos durante uma época de guerra, quando os remédios eram escassos e elas acreditavam que realmente funcionavam.
Ele abaixou o olhar e olhou para o charuto que segurava. Ele havia parado de fumar seis anos atrás, quando ele e Annette começaram a namorar. Ela não parecia se importar com a fumaça ou o cheiro, mas ele voluntariamente parou de fumar por causa dela.
Ele não precisava mais ter uma boa aparência, então não precisava parar de fumar. No entanto, ainda não conseguia fumar novamente, porque… Quando sua mente vagou até aquele ponto, Heiner franziu levemente a testa.
“Você deve pensar que sou uma tola.” (A)
Se fosse esse o caso, ele não se sentiria tão sujo. ‘Era problema dela ou dele que, não importava o quanto ela fosse arrastada e pisoteada, ela ainda parecia tão virtuosa?’ Heiner sorriu amargamente. Ele esteve ponderando sobre isso há muito tempo, mas ainda não tinha chegado a uma conclusão.
‘Annette Valdemar, você toca minha parte mais sombria e fraca. Me faz infinitamente miserável. Pelo menos isso é problema seu e culpa sua.’
Heiner tirou o charuto da boca e endireitou o corpo, virando-se e entrando no quarto. Colocando o charuto no bolso do casaco novamente, ele olhou para a lata de lixo por um momento. As coisas que Annette havia pegado perderam o brilho e ficaram abandonadas na escuridão.
“Meu coração não é mais útil para você, de qualquer maneira.” (A)
Não, seu amor não é inútil. Ele queria que ela sentisse o desespero de não ser correspondida, esperava que o coração dela estivesse partido e miserável, exatamente como o dele. Então, pelo menos, Heiner precisava do coração dela.
Depois de verificar Annette, com um olhar abatido, entrou silenciosamente no banheiro. Ele abriu a torneira e água fria jorrou, então, ficou parado por um momento com as pontas dos dedos contra a água corrente.
Sentiu o lixo que Annette havia pegado na praia chacoalhar dentro dele.