Meu Amado Opressor - Capítulo 10
Annette estava jantando tarde quando Heiner entrou na sala de jantar. Parecia que ele tinha tomado banho logo depois do trabalho, já que seu cabelo estava molhado. Ao avistar Annette, Heiner gentilmente levantou as sobrancelhas.
“Agora?” – Ele falou com uma voz surpresa.
Annette respondeu com um leve aceno de cabeça. Ela não teve apetite o dia todo e ficou com fome tarde.
Heiner sentou-se e um criado trouxe um pouco de sopa e um copo. Enquanto isso, Annette silenciosamente levava a comida à boca, por um tempo, apenas o barulho dos pratos preenchia o espaço.
“Annette, ouvi dizer que Ansgar Stetter visitou a residência oficial.”
“…” – A mão de Annette segurando o garfo parou por um momento, ela levantou a cabeça e olhou para Heiner, que tinha uma expressão incomum.
O mesmo prato que o de Annette foi servido diante de Heiner. Era um pato moscovita recheado com uma guarnição mista de cogumelos, ovos e pão. Heiner dispensou todos os criados na sala de jantar com um gesto de mão.
“Sobre o que conversaram?”
“Você não já ouviu sobre tudo?”
“Ainda assim, não é a mesma coisa que ouvir isso da boca das partes envolvidas, não é?”
“…Ele me pediu para ir à França com ele depois do divórcio. Só isso.”
“Vai se casar com ele?” – Um sorriso seco apareceu nos lábios de Heiner.
“Foi por isso que pediu o divórcio? Para poder se casar com ele?”
“Esta foi a primeira vez que vi Ansgar em quatro anos.”
“Eu não sei, pode ter mantido contato com ele pelas minhas costas, como esteve cavando secretamente no meu passado.” – Mesmo que tivessem trocado contato, por que isso seria um assunto que deveria ser censurado por Heiner? A pergunta subiu ao topo de sua garganta, mas Annette não falou nada.
“Você não vai segurar a mão dele.” – Uma voz decisiva a ensurdeceu. – “Você nunca sairá daqui.”
Um olhar escuro e tenaz pousou no rosto de Annette. Ela olhou para os aspargos que acabara de cortar e pensou – ‘Se Ansgar estiver certo sobre ela ser a força de restauração da monarquia, é claro que Heiner não iria querer entregá-la a eles. Não era uma questão emocional. Talvez também seja por isso que ele não permitiu o divórcio, era mais fácil contê-la se estivessem legalmente vinculados… Mas então… por que os assessores de Heiner discordam dele sobre o divórcio?’
Ela não conseguia pensar em uma resposta adequada. Ela não era de forma alguma uma pessoa inteligente, pensou Annette. Na verdade, não havia nada que ela pudesse fazer sobre isso, mesmo depois de tentar raciocinar. Então parou de pensar. A força foi drenada de suas mãos e o garfo fez um som metálico ao bater no prato.
O olhar de Heiner se moveu para suas mãos finas.
***
Cedo pela manhã, Annette trocou de roupa para sair. Em sua bolsa havia dinheiro, remédio para dor de cabeça e um lenço. Por fim, terminou seus preparativos colocando o véu preto do chapéu sobre o rosto.
“Vou à igreja. Não preciso de acompanhante.”
“Mas, senhora.”
“Vou rezar. Não quero ser incomodada.”
“Primeiro deve obter permissão do comandante se deseja sair sozinha.”
Não havia como Heiner permitir isso. Ela até o questionou sobre o porquê tinha que pedir permissão a ele, mas o atendente era teimoso. No final, desistiu e deixou que a acompanhassem acompanhá-la.
Annette se dirigiu até uma igreja próxima. Apesar de já ter sido uma pessoa religiosa, agora havia parado de frequentar a igreja há muito tempo. Ela contrastava com Heiner, que, apesar de não ser uma pessoa religiosa, frequentava os cultos constantemente.
A igreja estava vazia ao meio-dia de um dia de semana. Annette colocou dinheiro na caixa de ofertas e sentou-se na primeira fila. Uma cruz pendia sobre a plataforma à sua frente. Annette rezou enquanto olhava para o crucifixo em transe, mas não fechou os olhos e nem juntou as mãos. Apenas falou de coração.
‘Perdoe-me pelos meus pecados. Perdoe-me por todos os pecados que cometi. Por favor, perdoe-me pelos meus pecados restantes. Por favor, salve-me.’ – Mas não houve resposta de volta. Apesar de algumas pessoas alegarem ter recebido respostas de Deus, Annette nunca havia experienciado isso.
Ela cerrou os punhos em desespero. – ‘Por que não me perdoa? Por que me jogou na lama? Por que me faz sofrer tanto? Por que eu…?’ – Annette, que estava expressando seu ressentimento, de repente parou de rezar. Era inútil, ela pensou, então pegou sua bolsa e se levantou.
Ela entregou uma carta ao atendente que esperava na entrada. – “Vá até o portão dos fundos e encontrará um senhor, por favor, dê isso a ele. Ele é deficiente físico, então pode se levar o tempo que precisar.”
“Posso examinar o conteúdo?”
“Faça o que quiser.”
A acompanhante, que abriu e leu a carta, decidiu que não havia nada de incomum nela e a colocou de volta no envelope. Assim que a acompanhante se foi, Annette saiu correndo da igreja. Nunca houve um velho esperando no portão dos fundos. Ela só precisava de uma desculpa para se livrar de sua acompanhante. Na estrada, pegou uma carruagem e solicitou que fosse levada à estação de trem. Quando a carruagem partiu, Annette olhou para trás, mas não viu ninguém a seguindo.
A carruagem aumentou a velocidade, Annette se recostou e fechou os olhos. Seu coração batia descontroladamente, sacudindo sua gaiola. Alguns dias atrás, ela viu o oceano em Glenford em um sonho. Ela queria vê-lo pessoalmente.
***
Ainda faltava um bom tempo para o trem partir, então sentou-se na sala de espera e observou as pessoas passando. Todos estavam se movendo atarefadamente e ela ficou imaginando o que estavam fazendo para se manterem tão ocupados. Annette inclinou a cabeça enquanto olhava para o garoto grunhindo com uma mala do tamanho do seu corpo.
‘Para onde eles estavam indo e o que estavam fazendo? Quais objetivos estavam trabalhando tão diligentemente para atingir?’
Foi realmente uma sensação renovadora, embora fosse natural que todas as pessoas tivessem suas próprias vidas. Também foi incrível que todos estivessem encontrando seu caminho sem se perder. O mundo girava rapidamente, exceto por Annette. Ela estava sozinha, parada contra a passagem do tempo.
Depois de um bom tempo o trem chegou à estação. Annette ficou parada na frente do trem com uma passagem na mão, sentindo-se perdida.
‘D200, G-12…’
Foi a primeira vez que precisou encontrar seu assento sozinha, pois fazia muito tempo que não pegava um trem e sempre era guiada pela tripulação até um assento especial. Por fim, pediu ajuda a um atendente. – “Com licença, poderia verificar minha passagem? Onde eu embarco…”
“Só um momento, por favor. Ah, é o próximo vagão. Há um mapa de assentos postado acima, por favor, verifique e sente-se.”
Após embarcar no trem, Annette teve a sorte de encontrar um assento imediatamente. Os assentos, com quatro pessoas de frente uma para a outra, eram pequenos e desconfortáveis. Os passageiros do trem carregavam jornais como escudos. Annette apertou o chapéu, pois temia que o jornal pudesse conter notícias sobre ela.
Levaria cerca de sete horas para chegar a Glenford. Annette olhou pela janela e, incapaz de suportar o tédio, comprou uma revista do vendedor do trem. Mas até isso foi rapidamente deixado de lado porque sua cabeça doía de tanto ler.
“Olá, moça.” – Uma senhora no banco da frente de repente a chamou.
“Sim?”
“Por acaso terminou de ler isso?”
“Oh… não, mas vou parar de ler agora. Gostaria de ler?”
“Eu adoraria.” – A senhora assentiu com a cabeça e aceitou a revista.
Annette a observou discretamente, ela malvestido parecia magro e pobre. Depois de observá-la por um tempo, comprou um sanduíche dividido ao meio e suco de laranja do vendedor. Ela levantou o véu levemente sobre a cabeça e deu uma mordida no sanduíche e sentiu o pão crocante escamoso em sua boca. Era o pior sanduíche que ela já tinha comido.
Annette cobriu o sanduíche com seu papel de embrulho. A senhora que estava lendo a revista levantou os olhos e olhou para ela.
“Por acaso gostaria de comer um?” – Perguntou Annette com voz gentil.
“A senhora não comprou para comer?”
“Sim, mas não me sinto bem.” – A senhora hesitou por um momento, então aceitou o sanduíche, murmurando – “Obrigada.”
“Não tem problema.”
A senhora inesperadamente deu uma grande mordida no sanduíche que Annette tinha comido um bocado. Mastigando ao mesmo tempo, falou: – “Aonde vai, mocinha?”
Annette respondeu alegremente. – “Estou indo para Glenford.”
“Férias?”
“Uhum… Quero ver o oceano.” – O mar em Glenford era famoso por sua beleza. Annette tinha ido lá há muito tempo.
“Sozinha? Por que não está com seu namorado?”
“Eu sou casada.”
“Oh, seu marido. Seu marido está fora?”
“Meu marido e eu não nos damos bem, falamos até em divórcio.”
“Você tem filhos?”
“Não, não tenho.”
“Menos mal, os jovens hoje em dia se divorciam muito. Não acho que seja um grande problema.”
“É mesmo?”
“Sim. Quando eu era mais jovem, era vergonhoso quando as mulheres se divorciavam, mas os tempos mudaram muito. A vida se tornou um pouco melhor para as mulheres, não há mais nobres e a vida está tão difícil quanto sempre, mas…”
Os lábios de Annette se contraíram, era difícil para ela responder casualmente. Ela também não gostava dos aristocratas? Seria bem estranho se Annette não gostasse também. Depois que Annette permaneceu em silêncio por um longo tempo, a senhora, que havia engolido um pedaço, perguntou.
“Por que você e seu marido não se dão bem?”
“É só que… Meu marido e todos os seus companheiros não gostam de mim. Também não quero mais viver com ele.”
“Não sentem nenhuma afeição um pelo outro?”
“Bem. Talvez para ele… mesmo que eu morra… não importará para ele.”
“Eu também conheço esse sentimento, o fato de alguém nos odiar é muito mais difícil de suportar do que pensam.” – disse em tom sério, largando o sanduíche que estava comendo. – “Mas é possível ser amado por todos. Então, apenas viva com aqueles que te amam.” – Sua voz soou um tanto desolada.
Annette estava atordoada e deu um pequeno aceno de cabeça. Sua boca estava amarga. Mas se todas as pessoas que a amavam estavam mortas, o que ela faria? Ela não queria que todos a amassem, só não queria ser odiada. Se tudo o que lhe restava era ódio, o que ela faria?
O trem balançou. Do lado de fora da janela, campos de trigo dourados se espalhavam, preenchendo a vastidão. A senhora abriu a outra embalagem amassada e tirou o resto do sanduíche. Olhando para os dedos enrugados dela, Annette entregou-lhe o copo de suco de laranja.