Meu Amado Opressor - Capítulo 02
Devemos deixar os remanescentes da monarquia da Padânia como estão? Annette guardou o jornal depois de ler o título de mau gosto. Discutir o que fazer sobre os aristocratas ainda vivos era um tópico inflamado diariamente. A maioria das propriedades foi confiscada. Obra de Heiner Valdemar. Ele expôs todas as injustiças econômicas e militares e segredos.
Mas os cidadãos ainda debatiam a expiação e o acerto de contas da monarquia. Isso porque alguns dos aristocratas e oficiais militares tinham fugido para o exílio em terras estrangeiras. Inúmeras cartas de condenação e ameaças foram enviadas a Annette, a esposa do Comandante Chefe. Isso se tornou ainda mais intenso após a proposta de lei dos Republicanos para liquidar a monarquia.
Annette, que estava olhando fixamente para as cartas empilhadas na mesa, cobriu a boca. Era enlouquecedoramente nojento. Parecia que ela vomitaria a qualquer momento. Depois de beber um gole de água fria, se levantou e saiu do quarto. O ar estava sufocante demais ali dentro para suportar. Ela queria andar no quintal deserto, então cruzou a mansão em um ritmo rápido e sentiu os olhares dos servos tocando-a como agulhas. Era extraordinário o quanto os servos fofocavam sobre ela.
Quando ela passou pelo corredor do primeiro andar, deu de cara com um rosto que não gostava de ver.
“Senhora Valdemar.”
“…Major Eugen.”
Era Eugen Markov, um subordinado leal de Heiner e um dos muitos que a desprezavam.
“Já faz um tempo, está em paz?” – Eugen perguntou com um sorriso. Era uma saudação comum, geralmente com a resposta – “Sim.”
Mas o ponto principal era diferente. Ele queria dizer que ela não deveria estar em paz.
“Como sempre.” – Annette respondeu com vaidade espremida. Ela foi embora com um pequeno murmúrio – “Adeus.” – Ela não queria mais falar com Eugen.
“O congressista Günther fez uma proposta de casamento.” – A voz que a seguiu arrastava os pés. As palavras dele eram fora do comum.
Annette virou a cabeça ligeiramente e sorriu. – “…Parabéns.”
“Não para mim, mas para o Comandante Chefe Heiner.” – Seus lábios estavam rígidos enquanto ela sorria. – “Ele propõe um casamento com Annelie Engels, que estava na milícia. Ela também é uma colega de operações do Comandante Chefe.” – O tom dele era prático. Eugen sempre a provocava com seu tom de voz casual.
Republicano Günther Engels. Ele foi a principal força por trás da vitória da revolução ao desarmar os sindicatos ilegais e uma grande figura que participou do estabelecimento do Governo Provisório. Sua esposa e filho foram mortos a tiros durante as manifestações, sua filha Annelie Engels era ativa em organizações de milícias. Naturalmente, ele vinha recebendo grande apoio do público até hoje. Em muitos aspectos, ele era o oposto de Annette.
“…Por que está me dizendo isso?”
“A propósito, madame.” – Eugen zombou. – “Ainda mora no jardim de flores?”
Uma rosa em um jardim de flores. Era um termo depreciativo que as pessoas a chamavam em zombaria. No momento em que ela ouviu isso, sua cabeça ficou assustadoramente calma e olhou para Eugen com um rosto desprovido de emoção.
Eugen disse sarcasticamente. – “A madame não é mais filha de um homem poderoso, agora é meramente um resquício do passado que deve ser esquecido. Leia qualquer jornal e entenderá.”
“….”
“É puramente a vontade do Comandante Chefe que ainda consiga manter a cabeça sobre os ombros. Você é uma mancha na reputação dele. O que as pessoas dizem sobre seu casamento…”
“Ontem pedi o divórcio ao meu marido.” – Annette o interrompeu com um olhar cansado.
Eugen demorou um pouco antes de perguntar de volta. – “…O quê?”
“Eu exigi o divórcio e Heiner não aceitou. Aparentemente, ele quer me ver infeliz de perto.”
Até ontem, tinha sido difícil para Annette entender as intenções de Heiner, mas agora que ele havia dito isso em voz alta, parecia um pouco mais compreensível.
“É porque Heiner me odeia, percebi esse fato tarde demais. O Major me odeia, todos me odeiam, então por que ele não odiaria também?” – A voz lamentosa de Annette ecoou pelo corredor.
Eugen parecia perplexo, como se não tivesse previsto essa situação. Ele não entendia, para Annette, seu último salva-vidas era Heiner Valdemar. Não havia lugar no mundo que a aceitaria se ela se divorciasse dele. Era senso comum que ela não iria querer o divórcio, mesmo que Heiner quisesse.
“Então pedi o divórcio. Eu ficaria grata se o Major pudesse persuadir meu marido a concordar, já que suas intenções e as minhas parecem coincidir.”
“….”
“Faça o que quiser com essa informação, queira espalhá-la nos jornais ou não.” – Annette sorriu lindamente.
***
No dia seguinte, um artigo sobre o senador Günther fazendo uma proposta de casamento a Heiner Valdemar com sua filha foi amplamente divulgado. Uma união entre um senador republicano e o Comandante Chefe. Havia um conflito entre olhares acolhedores e alarmados, mas era uma questão terrível de qualquer forma.
A reação positiva foi um pouco mais predominante porque dois anos antes os dois haviam lidado de forma justa e limpa com uma disputa interna entre as principais forças revolucionárias. Nem é preciso dizer que a posição de Annette, que era quase inexistente, havia se estreitado ainda mais. Todos os seus parentes também viraram as costas.
O divórcio de Heiner e Annette se tornou um fato consumado em meio a rumores. Era necessário, os olhos do público. As pessoas queriam sua queda, mas sua posição como esposa do Comandante Chefe impedia sua infelicidade. Quanto a Annette, este lugar era apenas outro inferno, mas de fora, parecia que ela estava vivendo pacificamente com os olhos fechados e os ouvidos tapados.
‘Então é natural que falem mal de mim’ – pensou Annette.
Ela estava deitada na cama e olhava para as molduras altas do teto. Deitada sozinha naquele quarto enorme, ela se sentia como um cadáver em um caixão. Annette virou-se e deitou-se de lado. Várias cópias do jornal que ela havia lido antes estavam espalhadas no chão. Um dos jornais vespertinos publicou um artigo que listava e criticava o preço de todos os vestidos e joias que ela teve no passado.
‘Se lesse algumas linhas do jornal, você saberia.’ – Annette lia o jornal com frequência. O problema era que ela não conseguia ler tudo.
Ela fechou os olhos, mas não conseguia dormir por causa da forte dor de cabeça. As enxaquecas, que começaram com o estresse e tornaram-se crônicas com o tempo. Havia cada vez mais dias em que tinha que tomar pílulas para dor de cabeça ou sonífero para conseguir dormir um pouco.
Toc toc.
De repente, houve uma batida na porta e logo foi aberta silenciosamente. Annette prendeu a respiração enquanto observava a luz vazando refletida na parede. Passos ecoavam pela sala desolada.
“Senhora…” – Heiner sentou-se na cama e chamou-a em voz baixa. – “Annette.”
Annette não respondeu. Não porque ela não quisesse responder, mas porque simplesmente não se sentia bem. E sua cabeça doía.
Heiner soltou um suspiro baixo atrás dela. – “Eu sei que não está dormindo. Apenas escute.”
“….”
“Não sei se sabe disso, mas recebi uma proposta de casamento de alguém do Congresso. Tentei recusar discretamente, já que não tinha intenção de aceitar de forma alguma, mas a informação vazou… Não há como impedir os rumores agora.”
“…”
“Se está ansiosa por isso, estou lhe dizendo para desistir.” – Houve um breve silêncio antes que ele falasse novamente. – “Você não vai deixar este lugar.”
Ele agia como se não quisesse pronunciar a palavra “divórcio”, o céu desabaria se ele dissesse essa palavra?
Annette deitou-se e disse calmamente. – “Dizem que eu deveria ter caído completamente, mas que ainda vivo em abundância por ser a esposa do Comandante Chefe. Se perguntam por que o Comandante Chefe não se divorciou. Questionam se não importa o quanto tenha ajudado o Exército Revolucionário, por ter sido subordinado do Marquês e Comandante da Legião, ainda não conseguiu abandonar o hábito de proteger a família real.”
“São só palavras.”
“As pessoas dizem que sou uma mancha em sua reputação.” – Annette sentou-se. Seus cabelos dourados caíam em cascata sobre seus ombros e costas.
Ela se virou e olhou para Heiner. Os olhos dele, que ela encontrou de perto, pareciam cheios de escuridão. Eram olhos que não conheciam alegria. Annette já amou a alegria de seu amado. Ela amava seu rosto sorridente e sua voz gentil, mas nada daquilo era real. Heiner Valdemar era realmente um espião competente.
“Você ainda tem algum outro ressentimento por mim?”
“Não sei onde pensa que viverá bem quando sair daqui, Annette. Talvez tenha escondido dinheiro sem meu conhecimento?”
Annette riu alto. Ela ficou surpresa que Heiner tivesse dito tal coisa. Ele não era o homem que sabia de tudo no mundo e tudo passava por suas mãos?
“Não tenho nada e nem para onde ir. Como você sabe.”
“Se esqueceu de que entrou em contato com aqueles que estavam no círculo íntimo do seu pai para descobrir meu passado?”
“Como poderiam me ajudar se estão na prisão? E faz muito tempo que comecei a investigar seu passado. Nesse meio tempo, todos eles foram executados ou enviados para prisões na ilha. Posso listá-los pelo nome, se desejar.”
“Seu pai tinha ótimas conexões, não dá para ter certeza. E não é como se você não soubesse que alguns que escaparam estão vivendo bem em exílio no exterior.”
“Prometo que não irei para o exterior. Nem levarei nada desta casa comigo. Apenas o divórcio.”
“…Não quero mais ouvir sobre isso.”