As Noites da Imperatriz (novel) - Capítulo 08
Tradução: Gab
Revisão: Gab
Aran obedeceu de má vontade à ordem de Enoch. Se recusasse a comer, tanto ela
quanto a criada teriam problemas — disso tinha certeza. À primeira vista, o Grão-
Duque era um homem calmo e ponderado, mas, na realidade, a Aran o via como
alguém instável e imprevisível. Jamais sabia o que esperar dele.
Assim como na noite anterior…
Aran obrigou-se a sentar e forçou a comida goela abaixo de qualquer jeito.— “Quem
levou os documentos?”— perguntou ela.
“O Grão-Duque os levou consigo” — respondeu a criada.
Isso foi um alívio. Se Enoch verificasse o conteúdo, o caso comercial poderia ser
aprovado a tempo. Afinal, ninguém precisava da opinião ou do consentimento de
Aran — era Enoch, não ela, quem ditava os assuntos do reino.
Curiosamente, porém, ela não sentia raiva por ter perdido o poder. Aran sabia,
melhor do que ninguém, que nunca fora feita para ser uma Imperatriz Regente —
muito antes da rebelião, já o sabia. Ainda assim, continuava a se agarrar aos
assuntos políticos e administrativos enquanto conseguisse. Afogar-se no trabalho
era a melhor forma de esquecer sua própria situação.
Depois de uma ou duas colheradas, Aran terminou, e a criada retirou o prato. Era
hora de tomar o remédio. Após engolir o líquido amargo, sua língua ficou
dormente, mas ao menos ela recuperou um pouco de energia para se levantar.
A criada ajudou-a a trocar de roupa. Aran queria se lavar, sentia-se grudenta e
coberta de suor frio, mas não podia. A febre alta a consumia. Sentou-se em uma
cadeira e abriu um livro. Como seu horário estava bagunçado, achou melhor
estudar. Sabia quase nada sobre ser uma Imperatriz Regente, por conta de sua
relutância e desinteresse por política desde jovem.
Sentada na cadeira, uma pontada de dor percorreu-lhe as partes íntimas. Virou a
página, tentando disfarçar o incomôdo. A criada percebeu seu corpo tremer e
cobriu seus ombros com um cobertor grosso.— “Apenas descanse hoje, Vossa
Majestade.”
Aran assentiu, mas teimosamente manteve os olhos no livro.—“Está tudo bem.
Pode ir descansar.”
“Como eu poderia descansar tranquila sabendo que Vossa Majestade está doente?”
— disse a criada, constrangida.
Aran ficou grata pela gentileza, mas um tanto irritada. Não conseguia se mover
para uma posição confortável na presença da moça. Além disso, as palavras da
criada a fizeram lembrar do que Enoch dissera na noite anterior, o que a deixou
ainda mais frustrada. No fim, Aran foi obrigada a dispensá-la.
Assim que a criada saiu, ela se acomodou na cadeira, subindo os pés e dobrando os
joelhos. Suspirou aliviada. A dor havia passado. Então inclinou-se sobre o livro e o
observou.
‘Que Imperatriz mais inútil…’
Jamais existira um monarca mais patético do que ela, uma imperatriz impotente,
que nada sabia e nada podia fazer. Às vezes, achava que seria melhor cair no
abismo da morte. Aran fitou o livro com o olhar vazio e suspirou. Não podia desistir
tão facilmente. Sua razão de viver não tinha a ver com orgulho ou aparência — era
algo além disso. Enquanto ocupasse o trono, desejava, ao menos, fazer o bem ao
povo e aos mais humildes.
Pegou o livro novamente e se forçou a ler, mas a dor que pulsava entre as pernas
tornava isso quase impossível.— “Nao fiz nada o dia inteiro, então por que esta tão
difícil me concentrar?” — murmurou, esfregando as têmporas. —” Nao posso
passar o resto da vida assim, em vão.”
Nesse momento, passos distantes começaram a ecoar. O som pesado e firme
daqueles passos largos não pertenciam a uma mulher. Havia apenas um homem que
poderia vir ao quarto da monarca a esta hora da noite.
A Aran ficou imóvel.
“Sou eu. Posso entrar?”— disse uma voz baixa e profunda, destruindo as esperanças
de Aran.
Ela olhou ao redor, como se procurasse um lugar para se esconder. Fechou o livro
às pressas e deitou-se na cama, decidindo fingir que dormia.
“Vossa Majestade.” — chamou Enoch novamente, dessa vez com mais urgência.
Aran fechou os olhos com força e puxou o cobertor sobre a cabeça. Nao esperava
vê-lo outra vez, não hoje, não quando não estava em condições de se entregar ao
prazer. Era evidente que a “arma” dele apenas lhe traria dor.
A mulher mordeu os lábios. E se ele se irritar? O pensamento a apavorou. Enoch
nunca havia ameaçado bater nela ou expulsá-la, mas ela não sabia se isso
continuaria assim no futuro. Ele podia matá-la, tomar o trono se quisesse. Aran
jamais se esqueceria do sangue do irmão espalhado pelo chão.
Enoch perdeu a paciência. Abriu a porta e aproximou-se da cama onde Aran jazia,
com passos firmes e controlados.